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LULA PB

Autor(es): PAULO DE TARSO LYRA

Correio Braziliense

Dilma vai se reunir com o ex-presidente para traçar a estratégia da segunda metade do mandato. Entre os temas em pauta, estão o relacionamento com a base aliada no Congresso e as medidas para aquecer a economia

Depois de apontar os rumos da administração de Fernando Haddad em São Paulo, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva estará com Dilma Rousseff até o fim do mês para afinar o ritmo do governo federal nesta segunda metade do mandato presidencial. Com um Produto Interno Bruto (PIB) claudicante; obras do PAC e da Copa do Mundo em ritmo sofrível; empresários receosos de investir; e uma classe política ressentida de maior atenção, Dilma ainda surfa nos altos índices de popularidade, mas, segundo aliados, é preciso adotar medidas preventivas para evitar problemas futuros. “Não podemos deixar que o discurso da oposição de desconstrução da gerentona cole no imaginário da população”, disse um petista com bom trânsito no governo.

Neste ponto, Lula, que voltou à cena depois de um mergulho no fim do ano passado — provocado, principalmente, pelos desdobramentos do julgamento do mensalão e pela deflagração da Operação Porto Seguro —, poderá dar dicas preciosas à presidente, segundo pessoas próximas a ele. “Lula conversava, tentava convencer no debate de ideias. Não há nada mais afrodisíaco para um político do que saber que tem a atenção do presidente da República”, declarou um dirigente partidário. Ele lembra que, durante o governo Lula, muitos parlamentares chegavam a tuitar os encontros presidenciais. “Essa mensagem, na base eleitoral dos parlamentares, valia ouro. Hoje, essa relação é inexistente”, lamentou o dirigente político.
O encontro de ambos deve ocorrer provavelmente em São Paulo. Lula sempre deixou claro que é conselheiro da presidente, mas que não iria se intrometer nas decisões que ela tomava na administração. A presidente costuma recorrer a ele com frequência. “Essa parceria vem desde os tempos da campanha. A pessoa com quem a presidente mais conversa é o Lula. Por que mudaria isso agora?”, afirmou o deputado Cândido Vaccarezza (PT-SP), que foi líder do governo de ambos.
Lula também tem sido, nas últimas semanas, confidente do empresariado, que tem reclamado do excesso de intervencionismo da presidente Dilma. A pressão dos representantes do PIB surtiu efeito e a presidente iniciou o ano recebendo-os em audiências individuais. “No ano passado, ela estava muito concentrada na conclusão dos pacotes de infraestrutura. Agora, que está com mais tempo, poderá ter essas conversas reservadas, que deverão se intensificar até 2014”, garantiu um aliado da presidente.

Os políticos estão preocupados, contudo, com o ritmo do governo. A avaliação é de que as obras de infraestrutura — incluindo as que servirão para a Copa do Mundo — estão em um ritmo aquém do necessário. Não será uma simples conversa, concordam eles, que terá o poder de destravar canteiros de obras. “Mas a burocracia está paralisando o governo”, reclamou um petista, lembrando que Lula sempre reclamou da inércia da máquina pública na hora de acelerar investimentos e projetos. “Nunca as palavras do ex-presidente foram tão atuais”, reforçou.

Excesso de zelo

Ainda está viva na memória dos parceiros a imagem traçada pelo atual ministro da Educação, Aloizio Mercadante, ao assumir a vaga no lugar de Fernando Haddad. Ele aconselhou seu sucessor, Marco Antonio Raupp, no Ministério da Ciência e Tecnologia, a se acostumar com a presidente, porque ela costumava “espancar os projetos”. Na opiniões de políticos, esse excesso de zeloemperra as ações governamentais.

Para o deputado Carlos Zarattini (PT-SP), Dilma tem se esforçado para apresentar as condições ideais para aumentar o nível de investimentos no país. “Ela tem apresentado grandes projetos, estimulado as parcerias com a iniciativa privada e reduzido a taxa de juros”, disse Zarattini. “Essas conversas individualizadas são importantes para afastar os temores”, completou o parlamentar petista.

Dilma também tem problemas na condução política. Se nos dois primeiros anos de mandato ela conseguiu blindar-se das queixas parlamentares, nesta reta final até 2014, ela deverá ter mais atenção com os deputados e senadores, seus grandes cabos eleitorais no caminho da reeleição. “Dilma afastou do Palácio do Planalto os políticos, colocando-os nos ministérios distantes, como Saúde, Educação e Comunicações (Alexandre Padilha, Aloizio Mercadante e Paulo Bernardo, respectivamente) e encheu seu entorno de técnicos. A base não tem interlocução com o Palácio”, reclamou um integrante do grupo governista no Congresso.

Outra queixa de aliados é a falta de politização das ações governamentais. Algo que, durante o governo Lula, era comum, alvo inclusive de ataques da oposição: o famoso “bater o bumbo”. “Passamos oito anos do governo Lula sofrendo com Meirelles (Henrique Meirelles, ex-presidente do Banco Central) segurando os juros lá no alto. Dilma baixou as taxas, fez uma intervenção branca nos bancos para que eles ampliassem o crédito, e isso não é celebrado”, reclamou um aliado do Planalto. “Isso não é economia, é política”, exasperou-se o parlamentar.

Os pecados

Confira quais são os sete problemas do governo apontados

1. Ritmo lento das obras do PAC
2. Crescimento pífio do PIB somado ao retorno do fantasma da inflação
3. Ausência de uma interlocução mais presente com o Congresso
4. Afagos raros aos aliados
5. Dificuldades em convencer o empresariado a investir
6. Burocracia reinante na máquina pública
7. Não politização das vitórias do governo (famoso bater o bumbo)

Povo brasileiro cresce econômica e socialmente (Foto Kátia Nascimento PMJ)

Relatório divulgado nesta semana pela Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) aponta que o Brasil será a única grande economia que apresentará retomada do crescimento nos próximos meses.

 

De acordo com a OCDE, o Brasil será exceção em um cenário global de queda da atividade econômica. Índia e China, segundo a OCDE, passarão por um processo mais acentuado de desaceleração econômica. Entre os países desenvolvidos, os da União Europeia, de acordo com o relatório, apresentaram maior sinal de fragilidade em relação à crise econômica e à retomada do crescimento.

O relatório aponta ainda que Japão, Estados Unidos e Rússia, apesar de apresentarem perspectiva positiva acima da média geral dos países da OCDE, continuam mostrando um esgotamento da dinâmica de crescimento econômico. A OCDE é formada por 34 países, a maior parte deles desenvolvidos, e tem o objetivo de promover políticas que melhorem o desenvolvimento econômico ao redor do mundo. O Brasil não integra a organização.

(Blog do Planalto)

Reproduzo artigo de Miguel do Rosário, publicado em seu blog:

Num post no blog do Nassif sobre a carga tributária no Brasil, encontrei um comentário muito interessante:

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Re: A carga tributária e o PIB
sab, 23/04/2011 – 14:19 — meiradarocha
Aqui está a realidade, Liberal:

O Brasil teve, em 2009, a 22ª carga tributária no mundo. Dos países que tinham carga tributária maior que a nossa, 14 eram países desenvolvidos europeus.

O país mais rico do mundo, a Noruega, tinha carga tributária de 43,6% e arrecadou 25 mil dólares per capita. O Brasil tinha carga tributária de 38,4% e arrecadou 4 mil dólares PPC per capita.

Gostaria que os liberais mostrassem como fazer o milagre de se ter serviços de 25 mil dólares arrecadando 4 mil.

*****

Gostei porque ele trouxe estatísticas que provam uma coisa óbvia. A comparação entre cargas tributárias dos diferentes países, repetidas de maneira leviana pela mídia, apenas fazem sentido se cotejadas com o tamanho do PIB per capita. Enfatizo o “per capita”, visto que os gastos mais importantes de um Estado são a previdência social e a saúde pública, cuja magnitude é atrelada naturalmente à população.

Se um país tem um PIB per capita alto, ele pode até se dar ao luxo de ter uma carga tributária menor, porque o total arrecadado é grande. O que nem é o caso, visto que as nações desenvolvidas, em geral tem uma carga tributária bem elevada.

Repete-se, por outro lado, que alguns países ricos tem carga tributária menor que a do Brasil, como os EUA. De fato, a carga tributária nos EUA é de 28%, contra 38,8% no Brasil. Entretanto, como os EUA tem um PIB monstruoso, tanto absoluto como per capita, essa carga corresponde a uma arrecadação per capita de 13 mil dólares. A do Brasil, é de 3,96 mil dólares… Ou seja, a expressão clichê sobre o Brasil ter impostos de norte da europa e serviços públicos de qualidade africana nunca me pareceu tão absurda e idiota.

Eu não sou a favor do aumento dos impostos. Tenho micro-empresa e estou sempre à beira de sucumbir sob o peso mastodôntico, complexo e kafkiano das taxas que desabam quase que diariamente sobre minha cabeça. Mas não podemos ver a questão com leviandade. A mídia patrocina uma campanha irresponsável contra o imposto no Brasil. Este deve ser simplificado, naturalmente, e porventura reduzido para empresas pequenas, mas devemos mostrar à sociedade a situação real. Não podemos nos comparar com nenhum país desenvolvido, porque o nosso PIB per capita ainda é baixo. Ainda temos que comer muito feijão com arroz.

Por outro lado, é igualmente injusto falar em “serviço público” africano, expressão que, além de ser politicamente incorreta, é também totalmente inexata. Temos uma previdência social quase universalizada. A saúde pública é abarrotada e sofre constrangimentos em vários setores, mas nosso sistema de vacinação é de primeiro mundo. O tratamento gratuito, inclusive com distribuição de remédios, que damos aos soropositivos, não encontra paralelo nem nos países mais avançados.

Não douremos a pílula, todavia. Ainda temos muito o que aprimorar em termos de serviço público, nas áreas de saúde, educação e infra-estrutura. Mas, por favor, sem a viralatice de nos compararmos às economias destruídas por longas guerras civis, nível de industrialização baixíssimo e desemprego às vezes superior à metade da população ativa.

O debate sobre a carga tributária tem que ser feito com muita seriedade, botando as cartas na mesa, evitando ao máximo o uso desses clichês desinformativos. Os impostos no Brasil são altos, pesam no bolso de empresários, classe média e no custo de vida dos trabalhadores. Mas em valores absolutos, o imposto é baixo, deixando pouca margem para o Estado gastar com serviços e infra-estrutura.

O caminho, portanto, é investir no crescimento econômico e na racionalização cada vez maior do gasto público. Seria loucura, porém, promover uma redução brusca da carga tributária, que implicaria em jogar o valor do imposto per capita no Brasil ao lado das nações mais atrasadas do planeta. Ajamos com prudência e responsabilidade, sem jamais deixar de lado o bem estar do povo e a necessidade de oferecer serviços de qualidade à população, pois sem isso poderemos até nos tornarmos um país rico, mas seremos sempre uma sociedade triste e miserável.

Gostei porque ele trouxe estatísticas que provam uma coisa óbvia. A comparação entre cargas tributárias dos diferentes países, repetidas de maneira leviana pela mídia, apenas fazem sentido se cotejadas com o tamanho do PIB per capita. Enfatizo o “per capita”, visto que os gastos mais importantes de um Estado são a previdência social e a saúde pública, cuja magnitude é atrelada naturalmente à população.

Se um país tem um PIB per capita alto, ele pode até se dar ao luxo de ter uma carga tributária menor, porque o total arrecadado é grande. O que nem é o caso, visto que as nações desenvolvidas, em geral tem uma carga tributária bem elevada.

Repete-se, por outro lado, que alguns países ricos tem carga tributária menor que a do Brasil, como os EUA. De fato, a carga tributária nos EUA é de 28%, contra 38,8% no Brasil. Entretanto, como os EUA tem um PIB monstruoso, tanto absoluto como per capita, essa carga corresponde a uma arrecadação per capita de 13 mil dólares. A do Brasil, é de 3,96 mil dólares… Ou seja, a expressão clichê sobre o Brasil ter impostos de norte da europa e serviços públicos de qualidade africana nunca me pareceu tão absurda e idiota.

Eu não sou a favor do aumento dos impostos. Tenho micro-empresa e estou sempre à beira de sucumbir sob o peso mastodôntico, complexo e kafkiano das taxas que desabam quase que diariamente sobre minha cabeça. Mas não podemos ver a questão com leviandade. A mídia patrocina uma campanha irresponsável contra o imposto no Brasil. Este deve ser simplificado, naturalmente, e porventura reduzido para empresas pequenas, mas devemos mostrar à sociedade a situação real. Não podemos nos comparar com nenhum país desenvolvido, porque o nosso PIB per capita ainda é baixo. Ainda temos que comer muito feijão com arroz.

Por outro lado, é igualmente injusto falar em “serviço público” africano, expressão que, além de ser politicamente incorreta, é também totalmente inexata. Temos uma previdência social quase universalizada. A saúde pública é abarrotada e sofre constrangimentos em vários setores, mas nosso sistema de vacinação é de primeiro mundo. O tratamento gratuito, inclusive com distribuição de remédios, que damos aos soropositivos, não encontra paralelo nem nos países mais avançados.

Não douremos a pílula, todavia. Ainda temos muito o que aprimorar em termos de serviço público, nas áreas de saúde, educação e infra-estrutura. Mas, por favor, sem a viralatice de nos compararmos às economias destruídas por longas guerras civis, nível de industrialização baixíssimo e desemprego às vezes superior à metade da população ativa.

O debate sobre a carga tributária tem que ser feito com muita seriedade, botando as cartas na mesa, evitando ao máximo o uso desses clichês desinformativos. Os impostos no Brasil são altos, pesam no bolso de empresários, classe média e no custo de vida dos trabalhadores. Mas em valores absolutos, o imposto é baixo, deixando pouca margem para o Estado gastar com serviços e infra-estrutura. O caminho, portanto, é investir no crescimento econômico e na racionalização cada vez maior do gasto público. Seria loucura, porém, promover uma redução brusca da carga tributária, que implicaria em jogar o valor do imposto per capita no Brasil ao lado das nações mais atrasadas do planeta. Ajamos com prudência e responsabilidade, sem jamais deixar de lado o bem estar do povo e a necessidade de oferecer serviços de qualidade à população, pois sem isso poderemos até nos tornarmos um país rico, mas seremos sempre uma sociedade triste e miserável.

Flávio Lúcio Rodrigues Vieira
João Pessoa, Paraíba, Brazil
Tem 43 anos, nasceu em Patos, capital do sertão paraibano, e é professor do Departamento de História da UFPB.

http://pensamentomultiplo.blogspot.com

Nenhum paraibano foi mais universal e internacional do que foi Celso Furtado, cuja extensa obra ainda serve de referência tanto para acadêmicos quanto para planejadores no âmbito do Estado. Celso Furtado nasceu há 90 anos em Pombal no dia em que seria assassinado João Pessoa dez anos depois, quando o futuro economista já morava na antiga cidade da Parahyba e estudava no Lyceu Paraibano. Foi a ousadia intelectual desse paraibano que tornou-o um clássico, um intérprete imprescindível do Brasil e de sua história. Furtado figura no panteão do pensamento brasileiro ao lado de nomes como Gilberto Freyre, Sergio Buarque de Holanda e Caio Prado Jr., pensadores que produziram um conjunto de obras que nos ajudaram a pensar e entender o Brasil a partir de modelos originais, e que tem todos eles como ponto comum a aproximá-los o uso da história como suporte de suas interpretações.

Com Formação Econômica do Brasil, publicada em 1958, depois que Celso Furtado voltou de Cambridge, onde ele havia concluído seus estudos pós-doutorais – isso depois de alguns anos de trabalho na CEPAL, instituição que ele ajudou a formar ao lado de Raul Prébish, – o economista paraibano promoveu uma importante guinada nos estudos sobre a história econômica do Brasil. Foi com Formação e as obras posteriores que Furtado ajudou a criar uma escola em que grandes economistas se formaram, a exemplo de Maria da Conceição Tavares, Carlos Lessa, José Luiz Fiori e tantos outros: o esturturalismo. E a profundidade e a perenidade da obra de Celso Furtado residem especialmente neste ponto: a economia brasileira e suas estruturas são historicamente determinadas e, sendo assim, são superáveis.

A problemática regional está expressa, na sua origem, como um problema do século XX, na oposição entre o setor agrário e o setor urbano-industrial, e nos conflitos resultantes dessas desigualdades. E o Estado joga um papel fundamental na sua resolução, palco privilegiado que é desses conflitos. A questão regional, em seu primeiro momento, expressou o reconhecimento de que as desigualdades regionais representavam entraves para o desenvolvimento capitalista, especialmente nos países de capitalismo tardio como o Brasil.

Apesar da obra intelectual de Celso Furtado ser muito mais ampla, darei destaque a que ele produziu tendo a região Nordeste como objeto de estudo. E ela parte de um pressuposto, que pode ser melhor visualizado quando nos defrontamos com a questão levantada pelo historiador inglês David Landes, que vem a ser o subtítulo de um grande livro chamado A riqueza e a pobreza das Nações: “porque algumas nações são tão ricas e outras tão pobres”.

Como eu afirmei na última quarta-feira (28) para uma platéia que participava do Encontro Nacional de Estudantes de Economia durante uma mesa redonda em homenagem ao pensamento do maior economista brasileiro, Celso Furtado, promovida pelo Conselho Regional de Economia: a questão levantada por Landes continua teimosamente a nos cobrar respostas de todos nós, e o Brasil não poderá avançar, a não ser reproduzindo as mazelas do velho modelo de desenvolvimento concentrador da renda, se não lograr superar as suas desigualdades sociais e regionais. Por isso, Celso Furtado continua tão atual.

Nos anos 1950, Furtado ousou perguntar ao país: por que algumas regiões brasileiras eram tão ricas e outras tão pobres? E por que, no interior dessas regiões, existem tantos pobres e tão poucos ricos? O que explica essas desigualdades e quais os meios para superá-las?

Sem dúvida, é dessa problemática que emerge a chamada “questão regional”, e a questão regional nordestina em particular, que nasceu nos anos 1950, quando o Brasil iniciava um novo ciclo de desenvolvimento com forte presença do capital estrangeiro. E os conflitos resultantes da implementação desse novo modelo se exprimem de maneira clara quando olhamos para as desigualdades regionais. Ainda na última quarta, o economista, presidente da Academia Paraibana de Letras e que foi amigo pessoal de Celso Furtado, Juarez Farias, lembrou um dado contundente levantado por ele próprio quando trabalhava no BNDE (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico) e que exprime muito bem o desprezo pela problemática regional: dos investimentos previstos para o Plano de Metas do governo JK, apenas 6% eram destinados ao Nordeste. Os outros 94% eram voltados para o Centro-Sul.

Nos anos JK, a política econômica era dirigida para o objetivo de consolidar o Brasil como país industrial, buscando completar o ciclo de substituição de importações. Entretanto, com a indústria concentrada no Sudeste e com inexistência de planos para desconcentrá-la, fica claro que as desigualdades regionais não eram vistas como um problema. E elas se acentuaram e se tornaram visíveis nos anos 1950 decorrentes, em parte, dessa reconfiguração do modelo de desenvolvimento brasileiro.

Foi nessa conjuntura que entraram em cena as idéias de Celso Furtado. Um ano depois de publicar o clássico Formação Econômica do Brasil, Furtado, então economista do BNDE e trabalhando no GTDN (Grupo de Trabalho para o Desenvolvimento do Nordeste) é convidado por JK para expor suas idéias sobre os problemas da região. Dessa exposição e do convencimento de JK das dimensões do problema, nasce a chamada Operação Nordeste, que foi o primeiro passo para a criação da Sudene. Celso Furtado foi convidado por JK a colocar no papel o que disse durante aquela reunião e do esboço dessas idéias nasce o mais impressionante e fundamentado documento oficial produzido sobre a região, que foi Uma política de desenvolvimento para o Nordeste, um clássico insuperável do diagnóstico social e econômico da região.

Ali, mais do que em qualquer outra oportunidade, o pensamento de Celso Furtado teve oportunidade de se tornar ação e suas interpretações sobre o Brasil, especialmente em Formação Econômica do Brasil, puderam ganhar um sentido prático. Celso Furtado começou a desenvolver uma visão crítica a respeito das políticas de açudagem elaboradas e colocadas em prática pelo DNOCS, e que sintetizavam as políticas voltadas para o Nordeste, à época hegemonizado por grupos oligárquicos rurais, e que ficaram conhecidas como “solução hidráulica”, que priorizava a construção de açudes e barragens para armazenamento d’água, numa região que ostenta altos índices de evaporação.

A partir dos estudos de Guimarães Duque, Celso Furtado passou a ter uma compreensão mais dinâmica dos problemas ecológicos e hidrológicos da região. Entretanto, o mais importante, e que faltava a esses estudos, era relacionar a ecologia às estruturas econômicas e sociais da região, pois isso permitiria perceber que os problemas ocasionados pela seca não eram provenientes desse fenômeno climático, mas daquelas estruturas sociais e econômicas reproduzidas por séculos no Nordeste. O atraso do Nordeste estava portanto, ligado à sua formação histórica e às estruturas arcaicas que perduravam.

Não foi por outro motivo que, num paradoxo aparente, foram exatamente os grupos oligárquicos nordestinos os que mais tenazmente se opuseram à criação da Sudene. Primeiro, porque ela seria vinculada diretamente à Presidência da República, fugindo ao controle desses grupos que dominaram por décadas os órgãos federais no Nordeste; segundo, porque Celso Furtado propunha uma completa reestruturação econômica da região, propondo que a política de desenvolvimento tivesse na indústria, através da industrialização, o vetor mais importante da modernização do Nordeste objetivando a diversificação da produção regional.

No documento do GTDN de autoria de Celso Furtado foi elaborada a primeira política global de desenvolvimento regional, cuja análise levava em consideração 4 aspectos importantes:

Disparidades entre os níveis de renda do Nordeste e do Centro-Sul e o ritmo de crescimento diferenciado, favorável à região mais industrializada, ao lado de uma inadequada concepção a respeito do desenvolvimento do país, que prejudicava fortemente a economia nordestina, o que era agravado pela manutenção de uma estrutura econômica arcaica e pelas dificuldades ocasionadas pela ecologia da região;

Predominância da pecuária extensiva e pela combinação do algodão com a produção de subsistência, o que gerava dificuldades sociais para a população rural que habitava o semi-árido nordestino. A ação do Estado se resumia, até então, às chamadas políticas de combate às secas, que tanto contribuíam para manter na região um “excedente demográfico” vivendo da agricultura de subsistência, como para reproduzir essa estrutura arcaica;

Diretrizes para mudar a estrutura da economia nordestina através a) do aumento de investimentos industriais b) transformação da ”faixa úmida” em zona produtora de alimentos para os centros urbanos que iriam se industrializar e c) transformação da zona semi-árida, objetivando o aumento da sua produtividade para torná-la mais resistente às secas.

Promoção da diversificação da produção interna, através da industrialização, que objetivava a) oferecer emprego a uma massa, estimada (final dos anos 50) em pelo menos meio milhão de pessoas sub-empregadas; b) promover a ascensão de uma nova classe dirigente, comprometida com o “espírito de desenvolvimento”, ou seja, uma burguesia urbana e rural para se contrapor as velhas oligarquias que dominavam a política e o Estado na região desde o Império.

Como chama a atenção o sociólogo Francisco de Oliveira, poucos textos perecem tão exitosos e derrotados ao mesmo tempo como esse produzido por Celso Furtado em nome do GTDN: de um lado, o Nordeste alcançou a tão sonhada e distante – no final dos anos 50 – industrialização, que possibilitou a metamorfose de parte das velhas oligarquias sem, no entanto, possibilitar às massas nordestinas a visão da prometida “terra de Canaã.” A pobreza se acentuou ganhando novos contornos. A riqueza cresceu e uma moderna burguesia emergiu, dando um tom lustroso à velha face da oligarquia, que apenas persiste como um zumbi nas práticas de controle do Estado no Nordeste e cuja hegemonia esmigalhou-se na subordinação a esse novo bloco de poder “moderno”.

Em 1964, os militares tomaram o poder, sendo Celso Furtado uma das suas primeiras vítimas, quando foi afastado da Superintendêcia da Sudene. Depois do golpe de Estado, os militares deram continuidade a essa mudança no Nordeste se apropriando das idéias de Furtado, retirando-lhes, entretanto, aquilo que seria o fator mais importante para impulsionar essas mudanças: o desenvolvimento e a modernização do Nordeste através da ampliação do investimento industrial e agrícola e do pleno emprego do capital e do trabalho. Tudo isso tendo como suporte a distribuição da renda e da terra.

51 anos depois da criação da Sudene esse objetivo finalmente começou a ser atingido quando os dados atuais sobre crescimento econômico e ascensão social começam a mostrar isso. Mas é preciso aprofundar esse movimento e dar-lhe mais rapidez, especialmente tocando naquilo que ainda permanece intocado: a concentração fundiária, especialmente na Zona da Mata, e uma reestruturação econômica e social do semi-árido através da adaptação de práticas econômicas è ecologia da região, além estímulo à desconcentração do investimento produtivo nas grandes cidades, redirecionando parte das atividades econômicas para zonas urbanas interioranas, onde já reside a maior parte de nossa população.

Sem isso, os avanços no Nordeste terão sempre um limite. Um limite que Celso Furtado ousou tentar superar, mostrando como poderia ser feito. Esse continua sendo o nosso desafio